Imagine Gonzagão sem sanfona, Pelé sem chuteira, vaqueiro sem gibão, etc. Exemplos assim são no mínimo inusitados, incomuns aos nossos olhos e tão estranhos quanto ver Jackson sem pandeiro.
Pasmem! Assim se encontra a estátua de Jackson do Pandeiro no centro de João Pessoa, danificada por vandalismo de pessoas vis e medíocres de forma ordinária e vulgar.
Considerando ser o vandalismo uma atitude destruidora, portanto, prejudicial ao estado e a sociedade, o ato se constitui crime contra o patrimônio público, conforme prescreve o Art. 163, do Código Penal Brasileiro, passivo de pena de reclusão e multa ao infrator.
Em que pese o rigor da Lei, a prática tornou-se recorrente em nosso país. Vândalos, cada vez mais ousados e sem razão aparente, continuam destruindo nosso rico patrimônio histórico, sócio e cultural.
Como se não bastasse a danificação de monumentos e prédios seculares, numa agressividade desmedida, atingem imagens de notáveis vultos de nossa cultura, a exemplo de Ariano Suassuna em Recife e Jackson do Pandeiro em João Pessoa, ocorridas recentemente.
Oh! Quão desagradável contemplar tamanha selvageria contra o monumento do instrumentista, compositor e cantor Jackson do Pandeiro, obra de expressivo valor artístico e cultural do escultor Jurandir Maciel em homenagem ao grande artista paraibano. Numa tresloucada ação o braço da escultura foi literalmente amputado, levando consigo o pandeiro, instrumento com o qual o artista mantinha absoluto domínio e intimidade.
Num misto de tristeza e repulsa, observei por instantes aquele quadro de insensatez. Perplexo, busquei sem resposta, um motivo convincente para o infausto cenário, fruto de mentes insanas e malfazejas.
A escultura em bronze reúne expressivo valor cultural, haja visto o que ele, o cantor, representa para nossa música, portanto, digno de nossa reverência. A imagem de caráter decorativo, hoje desfigurada, inibe e ofusca a beleza da praça.
Tal qual o espinho que de pequeno traz a ponta, assim também foi Jackson que muito cedo manifestou tendência musical. Foi em Alagoa Grande, sua terra, que tudo começou tocando instrumentos de percussão, com destaque o pandeiro. Graças a versatilidade e interpretação, foi responsável direto pela inclusão da música nordestina no contexto nacional, garantindo lugar na MPB e apontado pela crítica e pessoas do ramo como uma referência musical que lhe custou o merecido título de Rei do Ritmo.
Jackson do Pandeiro teve vida difícil, porém vitoriosa. Graças a coragem e perseverança, após perder o pai aos 13 anos, deixou a roça e ao lado de sua mãe partiu para Campina Grande em busca de oportunidades, depois João Pessoa, Recife, Rio de Janeiro, a grande vitrine do Brasil e outros centros, iniciando sua gloriosa carreira artística.
Foi exímio percussionista, tendo influenciado com estilo próprio a popularização da música e cultura nordestina no Brasil e exterior. Seus atributos musicais fizeram de Jackson uma referência, cabendo-lhe com mérito e justiça as maiores homenagens.
Os relatos evidenciam exaltação e repúdio: ao cantor meu enlevo, ao vandalismo indignação. Preservar é preciso e para tanto somos responsáveis. Calar nunca, omitir jamais, pois omissão implica em cumplicidade. Do contrário, num futuro bem próximo, nosso passado será esquecido e seremos um país sem memória, pois aquele que destrói sua história, destrói a si mesmo, portanto, não tem origem.
Contudo, Jackson, com ou sem pandeiro, será sempre lembrado pela expressiva colaboração a nossa música, principalmente pelos irmãos paraibanos, que dele se orgulham.
A preservação do nosso patrimônio assegura a perpetuidade de nossa história.
Preserve. Jackson do Pandeiro é nosso patrimônio imortal.
João Pessoa, 07 de junho de 2022.
Francisco Vieira é Professor
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